ANPD impõe suspensão à Meta sobre treinamento de IA
23/07/2024 ANPD, Direito Digital, ECA, Facebook, IA, Instagram, Inteligência artificial, Leis, LGPD, Messenger, Meta
A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) determinou medida preventiva que a Meta Platforms, incluindo Facebook Serviços Online do Brasil, suspenda imediatamente sua nova política de privacidade relacionada ao uso de dados pessoais para o treinamento de sistemas de IA generativa. A decisão visa proteger os direitos dos titulares de dados e evitar danos graves e irreparáveis. A Meta deve comprovar o cumprimento em cinco dias úteis, sob pena de multa diária de R$ 50.000,00 por descumprimento.
Ana Paula Siqueira, advogada especialista em Direito Digital, explica o que representa a determinação da ANPD. “É uma medida preventiva tomada pelos Diretores da ANPD para proteger os direitos dos titulares de dados pessoais e evitar danos graves ou irreparáveis. Pode ser aplicada imediatamente e sem aviso prévio ao interessado, com possibilidade de multa diária por descumprimento”.
Inicialmente, a conduta da empresa é analisada de forma preliminar, e uma avaliação mais detalhada é realizada posteriormente através de um processo fiscalizatório.
A ANPD determinou a suspensão da nova política de privacidade da Meta, que entrou em vigor em 26 de junho, devido a riscos significativos aos direitos de crianças e adolescentes brasileiros. Esta política permitia o uso de informações publicamente disponíveis e conteúdos compartilhados em plataformas como Facebook, Messenger e Instagram para treinamento de IA generativa, afetando potencialmente 102 milhões de usuários no Brasil.
A ANPD iniciou um processo de fiscalização de ofício ao identificar possíveis violações à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Após uma análise preliminar, foram encontradas várias irregularidades, incluindo o uso inadequado da base legal para tratamento de dados pessoais e a falta de informações claras e acessíveis sobre as mudanças na política de privacidade. Além disso, a Meta impôs limitações excessivas ao exercício dos direitos dos titulares e tratou dados pessoais de crianças e adolescentes sem as devidas salvaguardas.
A Lei nº 8.069/1990, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), categoriza crianças como pessoas até doze anos de idade incompletos, e adolescentes, aquelas entre doze e dezoito anos. O ECA assegura a proteção integral a crianças e adolescentes, garantindo todas as oportunidades e facilidades para seu desenvolvimento em condições de liberdade e dignidade, conforme o artigo 227 da Constituição Federal.
Esta legislação reforça a necessidade de salvaguardas e medidas de mitigação de risco, especialmente no tratamento de dados pessoais de menores. A LGPD, em seu artigo 14, impõe que o tratamento de dados pessoais de crianças e adolescentes seja realizado no melhor interesse do menor, observando os princípios e demais regras aplicáveis a qualquer operação de tratamento de dados.
“A Autoridade concluiu que a Meta não forneceu informações adequadas para que os titulares compreendessem as consequências do uso de seus dados para IA, criando obstáculos injustificados ao acesso às informações e ao exercício de direitos. A hipótese legal utilizada pela Meta, o legítimo interesse, foi considerada inadequada, especialmente para dados sensíveis e de menores, pois não observava os princípios de finalidade e necessidade”, explica Ana Paula.
A ANPD destacou que os dados compartilhados nas plataformas da Meta são geralmente destinados a interações pessoais e não para treinar sistemas de IA, que não existiam quando muitos dados foram compartilhados. A coleta e utilização de dados de crianças e adolescentes para IA violam a LGPD, que exige salvaguardas e medidas de mitigação de risco em tais casos.
Diante dessas constatações, a ANPD determinou a suspensão imediata da política de privacidade da Meta e do tratamento de dados para IA, com multa diária de R$ 50.000,00 por descumprimento, até que a empresa comprove a adequação de suas práticas à legislação vigente.